KOVTUN – LIFE (2020)

RELEASE

LIFE posiciona o Kovtun como um dos projetos mais caóticos da cena underground nacional, me perdoem o pouco conhecimento do segmento, mas não lembro de ter ouvido algo tão impactante em terras nacionais em muito tempo. Pintando paisagens sonoras detalhadas e em camadas de uma ampla paleta de tons, Raphael Mandra (o cara por trás do Kovtun) não apenas une as violentas guitarras de metal e um piano sombrio de Ab Marduk, seu fiel colaborador, mas sons cheios de brutalidade como a bateria insana de Lucas Santos e outras camadas sônicas não identificadas.

LIFE está cheio de impressionantes justaposições sonoras, em dado momento um ukelele e sons bizarros de alguém tentando respirar por Nilo VZ, um homem espancando algo ou sendo espancados, vidros sendo quebrados, gritos, berros, choros e distorções.

Mandra é obcecado em expor o lado sombrio da vida, mas com o fim caótico de seu longo relacionamento, a vida pareceu mais sem sentido e isso reflete em LIFE. De fato, DEATH, seu álbum anterior (no meio, entres eles teve o elogiado URUCUM, álbum com várias parcerias inusitadas, também de 2019) tinha uma áurea mais calma, melancólica e sóbria. No entanto com LIFE, deparamos com o niilismo puro, cru, acachapante, me parece uma reação contra alguma injustiça extrema (confirmado pelo autor) de modo que a autodestruição em que ele se metia não parecia necessariamente autodestruição. Isso é parte da razão pela qual, apesar de suas muitas virtudes, LIFE fica aquém de ser a obra-prima que ele poderia ser. O fascínio pela textura ocasionalmente dissolve as composições excêntricas que alimentavam o anterior DEATH. Mais do que isso, a desolação inabalável de Mandra estava começando a parecer uma postura muito perigosa; sua crescente decepção com o ser humano mexia com seu lado musical apontando para um padrão de exploração lírica por vezes absurda.

Dito isto, o álbum termina em um pico emocionalmente dilacerante – a faixa título “LIFE” mistura drama e introspecção de uma maneira que o Kovtun nunca havia conseguido antes. “Do you really think that life giving bliss?” pergunta o apático Kovtun persona, ainda tem o cover do shock rocker norte americano Marilyn Manson “Man That You Fear” como bônus track, uma alusão de como a perspectiva de um relacionamento muda com seu fim “The boy that you loved is the man that you fear”.

Em DEATH tínhamos um álbum calmo, reflexivo, sóbrio e tentando desmistificar a morte, em LIFE temos um álbum agressivo, quase irracional, de pura emoção, sombrio e cortante, fruto da maior decepção de um ser humano, humano, demasiado humano como eu e você.

Por Felício Júnior
Portal Popeek

KOVTUN

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